Resenha | Fédro: reencontro entre Reynaldo Gianecchini e José Celso Martinez Corrêa

Documentário Fédro será lançado dia 5 de janeiro no Star+ com produção da Phaedrus

A arte está aí para excitar o público e esse é um dos ensinamentos que o ator e diretor José Celso Martinez Corrêa passa na obra Fédro de Marcelo Sebá. O longa-metragem é um reencontro entre o ator Reynaldo Gianecchini e José, que o dirigiu há 20 anos no Teatro Oficina e que agora tem a mesma oportunidade em uma produção de Phaedrus que será lançada no streaming Star+ em 5 de janeiro. O Entretizei já assistiu e fizemos uma resenha para você.

Foto: divulgação

O documentário é carregado de reflexões que partem da leitura do texto Fedro de Platão com diálogo entre o jovem Fédro (Reynaldo Gianecchini) e Sócrates (José Celso Martinez Corrêa). A produção intimista começa com Reynaldo se preparando para a leitura do texto que perdura pelo filme inteiro. Assim que José adentra o cenário, o ator preenche todo o ambiente e é quase intimidante, o que deixa Reynaldo desconfortável em muitos momentos mas o desconforto não é maior que o afeto que trocam no primeiro abraço do reencontro. Trajados com roupas casuais, os atores se encontram em um lugar intimista do artista ao qual normalmente não temos acesso, e o longa nos dá essa oportunidade de observar sua preparação.

Com o decorrer do filme, é interessante observar o despir mental do ator Reynaldo Gianecchini, se sentindo cada vez mais à vontade com José, chamado de mestre. E fica claro do porque a admiração tão grande do ator com as diversas reflexões que José aborda, sempre influenciando na maneira de atuar de seu pupilo, e com suas posições políticas profundas. Manifestações sobre “Parangolé” de Hélio Oiticica, sobre o Tropicalismo, questões da época da ditadura e a necessidade dos artistas se despirem, no momento atual, como fizeram antes, em nome da arte causando uma revolução são pautas presentes.

E sendo o amor imprescindível à revolução, não seria estranho que fosse o assunto principal do texto platônico escolhido e adaptado por José Celso com um humor singular. Parte da leitura se passa em uma cama, cenário que estamos acostumados a relacionar ao amor e que José aproveita para relacionar à obra de arte, “palco-cama”, pois a obra está para o palco assim como o amor para a cama. 

Falando em amor, o diálogo tem foco em uma teoria de Lísias, amante de Fédro, e que Sócrates, apaixonado por Fédro, aproveita para contestar se aproximando intimamente do jovem e, paralelamente, podemos observar a aproximação de Gianecchini e José quando despem suas roupas e pensamentos.

E o despir também se encontra na descolonização da arte, assunto em que ele aproveita para citar nomes importantíssimos para a cultura indígena, como Sônia Guajajara, Ailton Krenak e Davi Kopenawa. Os cortes entre texto, reflexões sobre o teatro e análises são comuns no documentário e falas com críticas ao monoteísmo, ao governo atual e, no geral, a coisas que limitam o artista são fundamentais para entender o trabalho do Zé que se faz cada vez mais íntimo a cada minuto do longa. 

O “despir” tão presente em Fédro aparece ainda no começo do longa, com a música Cacilda interpretada por Maria Bethânia, que introduz ao filme a ideia do descobrimento de si próprio em um exercício contínuo dos atores em se entregar ao diálogo interpretado, às experiências de cada um, à arte. E o longa finaliza com a mesma trilha sonora que não poderia ser mais propícia em uma obra carregada de reflexões.

Nas lágrimas que derramei de mim pra mim / Em espetáculo me dei / Mirei no teu espelho e vi o espelho de ninguém

Mas na lábia pequena em que me descobri / Da boca de cena nasci / Pra grande lábia de viver o gozo de existir

E com você / Saber enfim / Que sim

Fingir, fingir, fingir / E atingir / O ser / De atriz
(José Miguel Wisnik)

Fédro é um discurso contra o preconceito, um documentário excitante, delicado e reflexivo!
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*Crédito da foto de destaque: divulgação

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