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Foto: divulgação/Diógenes Mendonça

Entrevista | Geyson Luiz: um talento em ascensão no audiovisual brasileiro

O ator fala sobre seus últimos projetos, a importância de valorizarmos a cultura nordestina e seus próximos passos profissionais

Com uma trajetória marcada pela determinação, Geyson Luiz, ator pernambucano de 27 anos, transformou desafios em conquistas. Nascido em Limoeiro, na Zona da Mata de Pernambuco, Geyson fugiu de casa aos 13 anos para investir em sua carreira artística, enfrentando uma fase difícil em Minas Gerais antes de encontrar seu lugar no circo e, mais tarde, na ONG Centro Cultural Piollin, em João Pessoa.

Hoje, o ator coleciona papeis de destaque no streaming e no cinema nacional. Na nova temporada de Sintonia – O Último Baile (2025), da Netflix, ele interpreta Bagre, um detento veterano. Também aguarda o lançamento de Maria e o Cangaço, na Disney+, além da estreia em festivais pelo país com O Braço e os longas pernambucanos Ao Sabor das Cinzas e Coração de Lona.

Geyson ganhou projeção nacional ao protagonizar Lama dos Dias (2018), série sobre o manguebeat, e se destacou na elogiada Cangaço Novo (2023). Sua história de superação e o espaço que tem conquistado para artistas nordestinos no cenário audiovisual são alguns dos temas que o ator aborda na entrevista a seguir, confira:

 

Entretetizei: Sua trajetória de vida é marcada por desafios e superação. Como foi o processo de sair de casa ainda jovem e transformar suas experiências em inspiração?

Geyson Luiz: O que é ser brasileiro? Acho uma pergunta difícil de digerir nos dias de hoje. Minhas escolhas foram feitas por necessidade, diante da sobrevivência. É preciso entender que todo pobre sonha, mas tudo ao redor faz com que nossos sonhos se tornem um vazio, ocupado pelas dores. Tornei-me artista pela insatisfação com um mundo doente, violento e ambicioso. Como pode haver algum consenso em um país marcado historicamente pelas desigualdades econômicas, sociais, culturais e políticas? Num país tão contraditório, dizer a verdade é um risco, e é assim que me torno artista: um ser do risco da verdade que sinto, daquilo que carrego na memória, dos sonhos que foram alimentados desde a infância. O teatro me salvou, e a arte trouxe alento àquele jovem que um dia esteve entregue à solidão das ruas. 

Já se perguntou por que a arte é tão marginalizada e desvalorizada na educação do nosso país? Porque o território da arte é o território da contestação, da sensibilidade e da disrupção do corpo no mundo, um campo imaginário infinito. Imagine só: quando tiram todas as ferramentas criativas de um jovem, a única coisa que sobra é a violência, e nos deparamos constantemente com uma afirmação colonial. O que é ser brasileiro? A vivência fez a construção da minha identidade, e o ofício de ser ator trouxe a possibilidade de afirmar que ainda não tiraram de nós a memória e os sonhos. 

A visceralidade de um ambiente caótico e efêmero tornava a arte uma tradução de inquietude e vulnerabilidade, que escancararam a alma de um pirralho que adormecia com pesadelos sobre os homens. Mas disso eu despertava na manhã seguinte cheio de sonhos vivos, acreditando que um dia poderia me tornar alguém cujas dores do mundo ainda assim dariam origem a uma rosa na rachadura do cimento. Ser brasileiro é ser sonhador e jamais ignorar a luta e a memória de seu povo. As palavras de Graciliano Ramos tomo como minhas: “Comovo-me em excesso por natureza e por ofício; acho medonho viver sem paixão”.

Foto: divulgação/Diógenes Mendonça

E: Você está em grandes produções de streaming, como Sintonia, Cangaço Novo e Maria e o Cangaço. Como tem sido essa fase de tantos projetos importantes e o que podemos esperar dos seus personagens nessas produções? 

GL: Acho que meu trabalho tem se destacado por ser o de um ator consciente do abismo que enfrento em cada obra, de mergulhar no vazio e emergir com a força de um xamã. Assumo a responsabilidade de dar vida a personagens antagônicos e reconhecer o poder da dialética por trás da criação, das aparências sensíveis às realidades inteligíveis, em relação à existência do indivíduo. A arte não é apenas entretenimento, não é apenas ação. Desejo que o público pense junto com os meus personagens, independentemente do papel, e reflita sobre o que está por trás das máscaras.

E: Ao longo dos anos, tem se falado mais sobre a valorização de artistas nordestinos no cenário nacional. Como você enxerga essa mudança e o que ainda precisa ser feito para abrir mais espaço no mercado?

GL: O Nordeste é um grande berço de artistas. Vários nordestinos se tornaram grandes nomes do audiovisual brasileiro. No entanto, as grandes produções do mercado sempre estiveram concentradas no eixo Rio–São Paulo, perpetuando uma perspectiva limitada sobre o trabalho do artista nordestino, muitas vezes reduzindo-o a estereótipos que reforçam uma ideia de inferioridade, sem oferecer um protagonismo de sustância. O país carrega tantas histórias, tantas lutas. Dentro do eixo Norte–Nordeste, os olhares estão voltados para novas narrativas e suas complexidades, que refletem as diversidades do nosso país, com seus sotaques, costumes e tradições únicas em cada estado.

No trabalho do ator, é essencial entender que não existe apenas uma forma de naturalidade. Construir uma personagem dentro dos padrões que o público já conhece é importante, mas na atuação não podemos nos limitar a estereótipos. Todo indivíduo carrega uma história, suas lutas e razões, que na arte trazemos para reflexão sobre a existência. O cinema independente tem mostrado o outro lado da moeda, destacando o Nordeste para o mundo, explorando novas narrativas e propondo ao público brasileiro conhecer mais sobre os “Brasis” que existem em nosso território.

E: A série Lama dos Dias trouxe muita visibilidade para a cena cultural de Recife e o movimento manguebeat. Como foi dar vida a essa produção e qual a importância desse resgate cultural para você?

GL: Por meio da arte, a humanidade expressa suas necessidades, crenças, desejos e sonhos. Para mim, expressar o manguebeat vai além de representar a história da cultura brasileira; é ser parte integrante desse movimento. Me considero um artista nascido também do manguebeat. A influência da cultura popular está presente em toda a minha trajetória como artista.

O manguebeat se tornou um movimento popular que, em seu início, tinha como objetivo denunciar as desigualdades, a pobreza e os problemas de Recife, propondo uma renovação cultural com o surgimento de ritmos que misturavam elementos da cultura tradicional com a cultura urbana. O movimento ultrapassou os limites da zona metropolitana, alcançando o sertão por meio do teatro, da dança, da música, das artes visuais e do audiovisual.

Foi a insatisfação com o “mundo doente” que me motivou a me reconhecer como ator, a assumir o ofício de comunicar ao povo, com poesia e arte, aquilo que enxergo, ouço e sinto sobre o outro. Os projetos precisam ir além do entretenimento; precisam nos fazer questionar, nos fazer pulsar, trazer poesia para o nosso dia a dia e ser o combustível que alimenta nossa alma.

Foto: divulgação/Diógenes Mendonça

E: Hoje, você concilia uma carreira artística com os estudos. Em algum momento foi mais difícil conseguir administrar o tempo entre eles? O que você espera construir no futuro a partir de sua formação?

GL: A universidade sempre foi um sonho de criança, um lugar onde eu pudesse me especializar na profissão à qual dediquei minha vida. Aprender ao máximo as linguagens que o ator pode explorar está em constante investigação e experiência, buscando versatilidade e autenticidade no meu trabalho, independentemente do método ou da linguagem. A vivência artística é fundamental para essa construção.

Sempre tive a necessidade de comunicar ao público, de transformar a inquietude do pensamento em criação. No entanto, conciliar os estudos com o trabalho sempre foi um grande desafio, especialmente por ser um rapaz vindo da periferia. As dificuldades são multiplicadas pela necessidade de se manter, principalmente em um país onde o artista é constantemente marginalizado.

Para mim, a universidade é uma espécie de “fuga” — digo, é o meu espaço livre de investigação e aprofundamento. Meu interesse na formação vai além de me tornar um ator mais completo; quero me tornar um educador acessível, alguém que possa contribuir não apenas artisticamente, mas também ser capaz de alimentar sementes, como aqueles vagalumes que iluminam nossos caminhos.

E: O que podemos esperar dos seus próximos passos profissionais?

GL: Meus planos são levar o cinema nordestino para todos os lugares do mundo. O Nordeste é um lugar cheio de encantos e mistérios, que carrega a história do país no trabalho, na educação, na força de cada indivíduo e na paixão ardente que levanta os nordestinos todos os dias. Temos orgulho da nossa cultura, da memória que o corpo sertanejo carrega. Dar vida às histórias do meu povo é a maior honra que eu possa ter.

Sou imensamente grato ao cinema nordestino. Fui revelado pelas mãos de artistas que são algumas das minhas maiores referências, influências e inspirações. Eles me fizeram acreditar que é possível, que a vida presta. Ainda não tiraram de nós a memória e os sonhos. No Nordeste, temos algo incomum, que não se encontra com tanta força em outros lugares: o afeto, a sabedoria, a generosidade de olhar para o próximo e, juntos, tornar o sonho vivo.

 

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Texto revisado por Layanne Rezende

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