Straight out of a telenovela, right?
Jane the Virgin foi a minha grande companheira dessa Pandemia e foi simplesmente uma das melhores produções americanas que eu assisti nos últimos tempos.
Confesso que não foi de primeira que a série me encantou – ela estreou em 2014 e eu só assisti seis anos depois. Alguns amigos e familiares já tinham comentado: “Essa série é a sua cara, assiste!”, mas aquele título não me pegou. Eu pensava: uma série sobre uma virgem?! E olha eu aqui, toda emocionada com tudo o que assisti.
Creio que nada acontece por acaso. Fazia um tempo que eu não pegava uma série grande e americana para maratonar – tenho me interessado mais pelas séries espanholas e brasileiras, talvez porque eu estava procurando algo menos “americanizado”, menos padrão. Ter começado a assistir Jane durante a quarentena me salvou, literalmente.
Inspirada numa telenovela venezuelana, a produção conta a história de Jane, uma menina de 23 anos que foi inseminada artificialmente por engano e, por vir de uma família muito católica e latina, a notícia foi um choque para todos. Ela já estava namorando com Michael (Brett Dier) e tinha inúmeros sonhos, como o de virar uma escritora. Tudo em sua vida mudou a partir daquele dia.
A série gira em torno das mulheres Villanueva – Jane (Gina Rodrigues), Alba ou Abuela (Ivonne Coll) e Xiomara (Andrea Navedo), as três atrizes porto-riquenhas simplesmente se entregaram profundamente nas personagens. Detalhe: durante toda a série, a Abuela fala só em espanhol.
Jennie Snyder (criadora da série) estruturou-a de forma que nós, latino-americanos, nos sentíssemos em casa. Sabe quando você respira aliviado por assistir algo que é a sua cara? É o acontece com Jane. Usando de forma muito inteligente a linguagem latina e o realismo mágico*, a narrativa ficou próxima à nossa realidade, com todos os clichês e exageros que uma boa telenovela latina possui, sem contar que Gina Rodriguez deu um show interpretando essa personagem tão especial.
Creio que o personagem que melhor representou todo esse exagero foi o Rogelio de La Vega (Jaime Camil). Ele é um ator renomado no México e tenta a todo custo conquistar a fama na América – o que também é uma crítica a essa famosa busca pela fama nos EUA. Para isso, Rogelio usa todo o seu talento dramático e dá um show de exageros. Cada cena dele é um sorriso no rosto. Não tem como negar que tudo é uma homenagem às telenovelas, sempre presentes na vida dos latinos.
Como uma pessoa que cresceu, literalmente, assistindo novelas, foi como ver toda a minha vida, até agora, na forma de uma série. O que dizer dos chiffhangers (reviravoltas)? Quando pensávamos que mais nada poderia acontecer, algo inesperado acontecia – para mim, o mais chocante foi a virada da temporada 4 para a 5. As reviravoltas tornaram a série ainda mais atraente e, junto à edição, apresentou uma nova forma de produzir série nos Estados Unidos.
Dar vida ao mundo ao redor dos personagens, apesar de já ser uma característica da narrativa latino-americana, é algo muito inovador para os EUA. Para mim, a parte mais fofa desse realismo mágico foram os corações, que brilhavam quando um personagem estava apaixonado. (Clichê? Sim, mas a gente ama!) – ainda mais quando vem acompanhado de um triângulo amoroso repleto de emoções.
Ao longo das temporadas, cada personagem teve sua chance de crescer. Um ponto interessante foi perceber como teve uma “quebra de padrões” entre os supostos mocinhos da história: Rafael (Justin Baldoni) começou como um galã, babaca e malhado e, após ser pai, foi aprendendo com a vida e se transformou completamente, de forma que era impossível não amar aquele personagem. O mesmo com Petra (Yael Grobglas): loira, magra, rica e mimada. Ela aprendeu tanto com a vida, que se tornou uma das personagens mais queridas da série. A forma como a vida foi aproximando-a de Jane fez com que uma nova relação surgisse, como de irmãs.
O fato é que TODO MUNDO foi o herói da história em algum momento. Cada um, com suas qualidades e defeitos, protagonizou uma bela história de vida, que, se pararmos para pensar, são como nossas histórias. Uma jovem solteira, completamente apaixonada e com sonhos de vida; uma mãe que engravidou muito cedo e teve que assumir responsabilidades antes do tempo; uma avó que migrou da Venezuela em busca de uma vida melhor para a sua família… Histórias que olhamos e nos identificamos, porque elas existem na vida real.
A forma como a história de cada personagem foi se conectando à do outro formou um novo jeito de caracterizar família, afinal, família não está apenas no sangue, mas também nas amizades, nas escolhas e encontros que vamos fazendo ao longo da vida. Essa “grande família” de Jane the Virgin conquistou nossos corações, como se eles agora fossem realmente parte da nossa família.
Representatividade
Sentir-se representado é muito importante, principalmente nos tempos de hoje – e isso inclui colocar latinos, negros e personagens LGBT como pessoas completamente normais e bem sucedidas, como realmente é ou pode acontecer na vida real. Não queremos mais ser retratados – apenas – como traficantes, pobres e sem sucesso na vida. Não é que isso não aconteça, mas é que nossa história vai muito além disso: somos diversos, somos importantes e queremos ver isso também na TV – não só na TV latina.
Ah, como foi emocionante acompanhar a história da Alba, avó da Jane, um rosto que representa todos os imigrantes latinos nos Estados Unidos. Acompanhar sua luta e todo seu processo de legalidade foi realmente tocante. Creio que muitas pessoas nem imaginam como é sair de seu país, sem dinheiro e com pouquíssimas coisas, para um país repleto de preconceito, leis imigratórias absurdas e xenofobismo. Alba passou por tudo isso com muita garra e coragem, mas sempre com uma certeza: que sua fé a sustentaria para ela ir até o fim. A cena em que ela recebe seu green card é certamente uma das que jamais vou me esquecer.
Jane The Virgin sempre será aquela série amiga que eu terei o prazer de comentar com todo mundo. É gratificante ver uma produção em que as mulheres são ensinadas a andarem juntas, em parceria e não a serem competitivas, como nós somos ensinadas. A união entre as mulheres é algo muito forte e que precisa ser reforçado. Essa série veio em um momento que o mundo precisava. Eu assisti e me apaixonei em um momento que eu precisava. E que venham mais produções assim.
Jane é uma série que fala de afeto, que enfatiza o poder do pensamento positivo e das pessoas de bom coração. É sobre histórias de amor que nem sempre acontecem da forma que nós desejamos. É sobre os conflitos da vida, das pessoas vulneráveis e do poder das amizades. É sobre respeitar e ser respeitado, não importa a raça, o gênero ou a orientação sexual. Tem tanta coisa pra gente aprender com Jane, que eu poderia ficar horas aqui listando – aliás, listas é algo que a gente vê durante a série inteira, rs.
Finalizo com uma fala da Ivonne Coll, que interpreta a Abuela, em que ela comenta sobre a questão do medo – que sempre estará presente em nossas vidas, assim como esteve na vida da Jane, mas não conseguiu impedir que ela seguisse em frente: “Está tudo bem sentir medo. O que não está bem é deixar que o medo nos impeça de viver.”
Todas as temporadas de Jane The Virgin estão disponíveis na Netflix.
*Realismo Mágico – termo usado em produções latinas e citado pela própria Jennie Urman no episódio 99. Significa dar vida a objetos inanimados e ao mundo à sua volta – como brinquedos que falam com os personagens, o coração que brilha quando apaixonado e objetos que se mexem nas cenas. Não é algo tradicional na TV americana, mas esteve presente o tempo todo em Jane The Virgin.
(Deixo aqui esse GIF só pra todos que também sofreram por esse casal perfeito aqui: #Jafael):
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