Mary Ann Evans, Emily Brontë, Anne Brontë, Amandine Aurore Lucile Dupin e Mary Shelley desafiaram convenções e legaram obras-primas à literatura mundial
Em um mundo onde a pena era, em sua maioria, empunhada por mãos masculinas, a história da literatura guarda um capítulo fascinante e revelador: o das mulheres que, para terem suas vozes ouvidas, adotaram pseudônimos masculinos. Uma jornada de talento, resiliência e a busca por reconhecimento em um contexto social que frequentemente as silenciava.
O Clube do Entretê apresenta uma série sobre mulheres talentosas que lutaram por reconhecimento na literatura.
O contexto restritivo
No século XIX, as mulheres enfrentavam barreiras significativas. As leis e os costumes as relegavam a um papel secundário na sociedade, com poucas oportunidades de educação formal e participação na vida pública. O casamento e a maternidade eram vistos como seus principais objetivos, e a escrita era considerada uma atividade inadequada para o então classificado “sexo frágil”.
A educação feminina, quando disponível, era focada em habilidades domésticas e sociais, como bordado, música e etiqueta. A literatura era vista como um passatempo, não como uma profissão. A falta de acesso à educação formal e à vida intelectual limitava as oportunidades das mulheres de desenvolverem suas habilidades literárias e de se tornarem autoras reconhecidas.
As vozes por trás dos pseudônimos
Mary Ann Evans com o pseudônimo George Eliot

Mary Ann Evans, já uma intelectual respeitada, adotou o pseudônimo masculino para que seu romance Middlemarch fosse julgado por seu mérito, e não por seu gênero. A revelação de sua identidade ocorreu gradualmente, à medida que sua reputação crescia.
No contexto do Realismo inglês, as obras de George Eliot mergulham profundamente na complexidade das relações humanas, explorando a moralidade e a busca por significado na vida. Seus romances, ricos em personagens multifacetados e dilemas éticos, refletem a realidade social da época, com suas contradições e desafios.
Essa abordagem realista e aprofundada dos temas humanos confere às obras de Eliot uma relevância atemporal, pois os dilemas morais e a busca por identidade continuam a ser questões centrais na sociedade contemporânea.
Trecho: “A felicidade é uma coisa curiosa, parece gostar de se diminuir.”

Middlemarch foi publicado originalmente em oito partes, ou números, entre 1871 e 1872. A editora responsável pela primeira publicação da obra foi a William Blackwood and Sons.
Sinopse: em uma cidade fictícia inglesa, diversas tramas se entrelaçam, explorando temas como casamento, ambição e moralidade, em um retrato complexo da vida provinciana no século XIX.
Emily Brontë com o pseudônimo Ellis Bell
As irmãs Brontë, Emily e Anne, publicaram suas primeiras obras sob pseudônimos masculinos para evitar o preconceito. A autoria de O Morro dos Ventos Uivantes foi revelada após a morte de Emily.
As obras de Emily Brontë são marcadas por uma intensidade emocional que transcende as convenções sociais da época. Seus temas recorrentes, como a paixão avassaladora, a busca por vingança e a representação da natureza selvagem como um espelho das emoções humanas, exploram os limites da experiência humana.
A intensidade das emoções retratadas em suas obras, bem como a luta de seus personagens contra as normas sociais, ainda ressoam com o público moderno, que se identifica com a busca por autenticidade e a luta contra as injustiças.
Trecho: “Se ele me ama, que tipo de homem é esse?”

O livro O Morro dos Ventos Uivantes (originalmente Wuthering Heights) foi publicado pela primeira vez em 1847. A editora responsável por essa primeira edição foi a Thomas Cautley Newby.
Sinopse: uma história de amor obsessivo e vingança, ambientada nas charnecas sombrias da Inglaterra, onde paixões intensas e selvagens moldam o destino de duas famílias.
Anne Brontë com o pseudônimo Acton Bell

Assim como sua irmã, Anne Brontë usou um pseudônimo masculino. No livro, A Senhora de Wildfell Hall, Anne assinava como Acton Bell. A autoria da obra foi revelada após sua morte.
No contexto do Romantismo inglês, as obras de Anne Brontë se destacam por sua abordagem de temas como injustiça social, abuso e a busca por redenção. Além disso, através de suas narrativas, a autora expõe as duras realidades enfrentadas por mulheres e outros grupos marginalizados na sociedade vitoriana.
Essa exploração de temas, como abuso e injustiça social, juntamente com a busca por redenção, ainda ressoa com o público moderno, pois essas questões continuam a ser urgentes em nossa sociedade.
A luta contra o abuso e a busca por justiça são temas universais que transcendem o tempo, tornando as obras de Anne Brontë relevantes e impactantes para os leitores contemporâneos.
Trecho: “Todas as verdades são fáceis de entender uma vez que são descobertas; o ponto é descobri-las.”

O livro A Senhora de Wildfell Hall (originalmente The Tenant of Wildfell Hall) foi publicado pela primeira vez em 1848. A editora responsável por essa primeira edição foi a Thomas Cautley Newby.
Sinopse: uma mulher foge de um casamento abusivo e busca independência, desafiando as convenções sociais da época e enfrentando o julgamento da sociedade vitoriana.
Amandine Aurore Lucile Dupin com o pseudônimo George Sand

Amandine Aurore Lucile Dupin foi uma das escritoras mais famosas de sua época. Ela usou um pseudônimo masculino, George Sand, para se libertar das convenções sociais. Sua identidade era conhecida em vida. Uma de suas obras foi Lélia (1833).
Dentro do contexto do Romantismo francês, Amandine se destacou por abordar temas como a liberdade feminina, a paixão e a justiça social. Suas obras refletem o espírito da época, marcado pela busca por individualidade e pela crítica às convenções sociais. A autora desafiou as normas de gênero, tanto em sua vida pessoal quanto em sua escrita, criando personagens femininas fortes e independentes. A paixão é retratada como uma força avassaladora, capaz de transcender as barreiras sociais e emocionais.
A relevância de seus temas permanece atual, pois a busca por igualdade de gênero e a luta contra as normas sociais ainda são questões centrais no debate contemporâneo. Suas obras inspiram a reflexão sobre o papel da mulher na sociedade e a importância da liberdade individual.
Trecho: “Sou como um fantasma errante, que busca em vão a vida que perdeu.”

Lélia foi publicada originalmente em 1833. Durante a pesquisa para esta reportagem, não encontramos o nome da editora responsável pela publicação, mas há registros de informação de que a escritora tinha relacionamento com editoras francesas.
Sinopse: uma mulher à frente de seu tempo questiona os papéis tradicionais de gênero e busca um sentido mais profundo para a vida, explorando temas como amor, paixão e liberdade feminina.
Mary Shelley

A autoria de Frankenstein foi revelada na segunda edição do livro, mas sua contribuição foi frequentemente minimizada.
No contexto do Romantismo inglês, Mary Shelley criou Frankenstein, uma obra que explora a ambição científica, a responsabilidade e a natureza humana. Assim, através da história do Dr. Frankenstein e sua criatura, Shelley levanta questões sobre os limites da ciência e as consequências da busca por conhecimento sem ética.
Os dilemas éticos da ciência e a busca por identidade presentes na obra continuam relevantes na sociedade contemporânea, especialmente onde avanços científicos e tecnológicos levantam questões sobre a responsabilidade e os limites da intervenção humana na natureza.
Trecho: “Nada é tão doloroso para a mente humana quanto uma grande e súbita mudança.”

Frankenstein, ou O Prometeu Moderno, foi publicado pela primeira vez de forma anônima em 1º de janeiro de 1818. A editora responsável pela primeira edição foi a Lackington, Hughes, Harding, Mavor & Jones, uma pequena editora de Londres.
Sinopse: um cientista obcecado cria uma criatura monstruosa, desencadeando uma série de eventos trágicos que exploram os limites da ambição humana e as consequências da busca por poder.
A descoberta da autoria
A revelação da autoria feminina dessas obras foi um processo gradual e complexo. Em alguns casos, a identidade das autoras foi descoberta logo após a publicação, enquanto em outros, a verdade só veio à tona décadas depois. Nesse sentido, a pesquisa acadêmica, a análise de cartas e diários e a crescente valorização da literatura feminina foram fundamentais para desvendar esses mistérios.
O legado e a relevância
As obras dessas autoras são um testemunho do talento e da resiliência das mulheres que desafiaram as convenções sociais para terem suas vozes ouvidas. Além disso, seus temas e personagens continuam a ressoar com o público moderno, e, por conseguinte, suas histórias inspiram a luta por igualdade de gênero na literatura e na sociedade.
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Texto revisado por Cristiane Amarante