A atriz comentou sobre sua identificação com suas personagens e a falta de representatividade asiática na dublagem brasileira de Red, animação da Disney
Por Bianca Portante
A paulista Jacqueline Sato começou a carreira nas telinhas aos 12 anos no programa Sessão Super Heróis. Depois, a partir de 2012, estreou como atriz e deu vida a várias personagens do audiovisual brasileiro.
Em conversa com o Entretetizei, Jacqueline contou mais sobre sua carreira, a luta pela representatividade asiática no audiovisual e sobre as causas importantíssimas que ela constantemente relata em seus pronunciamentos.
Carreira e personagens
Jacqueline Sato está presente em várias obras audiovisuais que bombaram durante seus respectivos lançamentos, desde as novelas Além do Horizonte e Sol Nascente da Rede Globo, até a nova série da HBO Max, Os Ausentes.
A atriz destacou a preparação para interpretar a personagem Ayumi na série, também chamando atenção para Cristina Sano e a Carol Fioratti, atriz e diretora, respectivamente, do projeto. “Ver mulheres, e mulheres brasileiras asiáticas ocupando os mais diversos espaços com êxito é algo que me deixa muito feliz. Fora isso, como atriz, foi um desafio delicioso de cumprir, pois, quem assistir verá que ela não é nada óbvia, e também é bem diferente das personagens que fiz anteriormente.”, declarou Jacqueline.
Aproveitamos para perguntar quais entre as personagens já feitas, a atriz mais se identificou:
“A minha primeira, Bianca, tinha um lado protetor, que reconheço em mim. A Harumi, embora tenha sido algo mais pontual, me identifico pelo profissionalismo, de colocar isso à frente e não deixar que obstáculos e incômodos no caminho a desviem do que ela quer fazer. A Jessie Tattoo, tem um quê de despojamento, e um jeito engraçado que existe em mim quando estou à vontade; e também, na época, me fez entrar em contato mais direto com o lado sexy e dominador que eu já tinha, mas talvez usasse um pouco menos.
A Sandrinha, tem a ver comigo no sentido de estar ligada em tudo e tentar conduzir as coisas com leveza, por mais pesada que a situação possa ser. A Carol, divide comigo a visão de que as coisas tem seu tempo e que, tem horas que parece que um acontecimento é horrível, mas lá na frente, percebemos que foi a melhor coisa que poderia ter acontecido. A Yumi, divide comigo a paixão pela natureza, a escuta sempre aberta a ouvir e ajudar as pessoas que ama, e o compromisso em tentar ser congruente com aquilo que considera certo.
Marina, tem a coisa de achar que dá conta de tudo, meio superwoman que eu sei que, às vezes, tenho em mim. E a Ayumi, tem um amor que gera uma força sem limites dentro dela, que faz com que ela planeje e realize coisas bastante desafiadoras, e comigo é assim também, quando estou sintonizada com este sentimento é quando me sinto mais potente, criativa, e capaz.”
Audiovisual e Representatividade
A atriz e apresentadora, desde criança, se preocupa e viabiliza muitas pautas vinculadas à representatividade. A primeira delas é a exclusividade de papéis no audiovisual para pessoas brancas. Em conversa conosco, apesar de relatar um pequeno avanço nessa pauta, a atriz nos contou que, na maior parte do tempo, os testes para personagens, quando não exclusivamente vinculados à raça, não chegam aos atores e atrizes amarelos para que possam apresentar seu trabalho.
“Me orgulho de ter conquistado isso (personagens não pautados diretamente a questão racial como pré-requisito), mas sei que é uma exceção à regra. E é um fato: vários e vários testes que poderiam muito bem incluir pessoas amarelas como uma opção, nem chegam até nós.
O objetivo é que nos considerem como uma opção, nos testem e, a partir do resultado, escolham o talento que melhor atender ao personagem e à obra. O problema é que, muitas vezes, nem recebemos o teste, ou seja, nem temos chances de mostrar nosso trabalho. Por isso, digo que está mudando, mas ainda falta muito.”, relatou a apresentadora.
É possível validar essa discussão com o novo lançamento da Disney: Red: crescer é uma fera, que apesar de relatar diretamente questões de representatividade asiática, não teve nenhum ator asiático escalado para testes de dublagem no Brasil, ao contrário de outros países. Assim, houve uma mobilização de atores brasileiros, incluindo Jacqueline Sato sobre a questão, segundo ela:
“O caso de “RED: Crescer é uma fera” gerou tanto incômodo, justamente por vermos o contraste entre o cuidado que tiveram na hora de escolherem as vozes do original cumprindo lindamente com essa busca por representatividade, algo que chamou a atenção positivamente de todos, versus o descuidado sobre o mesmo ponto presente na escalação dos talentos na versão brasileira. E, de novo, o que mais incomoda, é que não houve teste com nenhum talento brasileiro asiático, sendo que temos sim grandes nomes que já dublaram profissionalmente antes.
Se houvesse teste, mas ninguém fosse aprovado, o incômodo não teria sido tão grande. Mas, de novo, é como se não existíssemos. Existimos sim, e somos muitos! Como afirmar que não tem nenhuma pessoa amarela capaz de realizar determinado trabalho, quando não há nem testes para que alguma delas mostre seu trabalho? Como todo profissional, o tempo, o estudo, a dedicação e a experiência é que os tornam melhores no que fazem, e tem muita gente boa pra caramba, que estuda, se prepara, e não tem chances no mercado por conta de algo estrutural que precisa ser mudado urgentemente. Este caso foi a gota d’água, pois coisas similares já aconteceram inúmeras vezes. Mas somos uma geração que quer transformar esta realidade e acredito que conseguiremos sim.
Sabemos que, em dublagem, nem sempre as características físicas da pessoa tem a ver com o personagem. Eu mesma, já dublei uma arara. Em nenhum momento fomos contra a profissão “dublador” e a gama de possibilidades que existem dentro desta profissão que, também tem seu encanto, por possibilitar que o artista seja personagens muito diferentes de quem ele é na vida real.
Estamos indo contra um sistema que escolhe Star Talents que nada tem a ver com os personagens, quando poderiam ter escolhido Star Talents que teriam tudo a ver e que fariam as pessoas se sentirem representadas. Um sistema que não abre testes para a escolha das vozes das personagens tendo diversidade e representatividade como uma das preocupações. Um sistema que, neste caso, privilegiou pessoas brancas e sequer testou algum talento que estivesse mais de acordo com o que foi proposto na versão original.
É um filme tão lindo, que conta a história de uma parcela da população que viu suas histórias serem contadas pouquíssimas vezes na vida, dirigido por uma mulher descendente de chineses, com tanta minúcia, cuidado e representatividade em todos os detalhes que, sim, foi um marco para nós, pessoas amarelas. Merecia que a versão brasileira estivesse à altura em relação a esta questão.”
Causas animais e ecológicas no audiovisual
Jacqueline Sato foi convidada a ser a nova embaixadora do Greenpeace Brasil, uma causa com a qual se envolvia desde criança. Além disso, também é responsável e CEO de uma associação chamada House of Cats, um programa que tem raízes na infância: quando ainda pequena a atriz resgatou gatinhos e, junto aos pais, procurou lares seguros e adequados aos animaizinhos. Hoje, a House of Cats é uma das maiores associações que possibilita uma nova vida aos felinos cheia de amor, dignidade e respeito que merecem.
Quando questionamos Jacqueline sobre a presença dessas pautas no audiovisual, a expectativa foi a mesma que a nossa: esperamos que seja cada vez uma pauta mais presente, representada e, com várias Jacquelines dando voz ao necessário.
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*Crédito da foto de destaque: divulgação