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Dia da Língua Espanhola: a força do idioma que moldou a cultura pop brasileira

Entre dublagens, refrões e bordões eternos, vem relembrar as produções latinas que influenciaram o entretenimento brasileiro. A cultura pop brasileira tem sotaque espanhol, e muita gente ainda se esquece disso

Hoje (23), é comemorado o Dia da Língua Espanhola, data decretada em 2010 pela Organização das Nações Unidas (ONU) para dar visibilidade ao idioma e a história que ele carrega. O dia foi escolhido como uma homenagem ao escritor e dramaturgo espanhol Miguel de Cervantes, autor do clássico Dom Quixote e precursor do Realismo na Espanha, que morreu em 22 de abril de 1616.

O Brasil é o único país de língua portuguesa na América Latina e, justamente por isso, muitos brasileiros – deliberadamente ou não – reforçados por uma visão eurocentrista, acabam ignorando a forte presença do espanhol, não apenas em nosso cotidiano, mas também na construção da nossa cultura popular ao longo da história.

A língua espanhola é o segundo idioma mais falado do mundo em número de falantes nativos, ficando atrás apenas do mandarim. Ignorar tudo o que ela representa é, em certo nível, negar intencionalmente os laços históricos e culturais que compartilhamos com os países hispanofalantes. Por isso, neste Dia da Língua Espanhola, é importante relembrarmos que muito do que conhecemos e apreciamos como entretenimento vem dessa cultura e que o espanhol exerceu, e ainda exerce, uma influência profunda na formação da identidade do brasileiro comum.

Novelas

As novelas são, com certeza, um ponto de contato direto que liga o Brasil ao universo hispânico. Produções, principalmente mexicanas e espanholas, marcaram presença massiva na televisão brasileira entre as décadas de 1980 e 2000, quando o SBT e a Record passaram a adotar essas histórias como parte de suas programações.

Considerando que, na época, as opções de canais eram restritas e o que era exibido nessas emissoras era consumido diariamente pela maior parte da população em escala nacional, podemos dizer que foi nesse período que a língua espanhola entrou na sala de estar, e nas vidas, de milhões de brasileiros.

Títulos como Rebelde (2004), Chaves (1973), Chapolin (1973), A Usurpadora (1998), Maria do Bairro (1995), Café com Aroma de Mulher (1994) e Betty, a Feia (1999) são produções lembradas, reprisadas, e regravadas até hoje, que não só foram sucessos de audiência, como moldaram comportamentos, influenciaram a moda adolescente e criaram bordões que romperam barreiras culturais, e perduraram por gerações. 

Imagem: reprodução/Uol

Ainda nos dias atuais você pode se deparar utilizando naturalmente frases como “foi sem querer querendo” ou “ninguém tem paciência comigo”, ou até mesmo se referir a alguém como “gentalha” sabendo exatamente de onde elas vieram, mas nem sempre estendendo o pensamento e se lembrar de que se trata de um seriado mexicano. A dublagem brasileira ficou tão marcada na nossa memória afetiva, que muitas vezes nos esquecemos de que originalmente, Chaves nesse caso, não foi gravado em português. 

Chiquititas também é um fenômeno que ganhou não uma, mas duas versões brasileiras  (1997 e 2013) e, até os dias de hoje, muita gente não sabe que a versão original da novela que nos rendeu hits como Mentirinhas e Coração com Buraquinhos era argentina.

Imagem: reprodução/O Globo

E o impacto cultural dessas novelas vai além da nostalgia. 

Personagens como Maria do Bairro, interpretada por Thalía, Paola Bracho, vivida por Gabriela Spanic, e Mia Colucci, de Anahí, se tornaram ícones que atravessaram gerações, ganharam versões brasileiras (como foi o caso de Rebelde Brasil, de 2011) e incitaram a construção de comunidades gigantes de fãs apaixonados, muitas das quais se mantêm ativas até hoje

É curioso de se observar também que, esse fenômeno não se restringiu apenas aos canais de televisão aberta. Nos anos 2010 quando o formato sofreu a primeira onda de migração para TV a cabo, as produções espanholas acompanharam e conquistaram espaço nos canais infanto juvenis, como o Disney Channel e a Nickelodeon.

Se você cresceu ouvindo seus pais contarem como era bom assistir Chapolin na televisão na época deles, mas não viveu isso ativamente, provavelmente acompanhou uma fase em que Disney e Nick travavam uma guerra fria para conquistar a atenção do público jovem com produções latinas. 

Da Disney vieram Isa TKM (2008), Isa TK+ (2009), Violetta (2012) e Soy Luna (2016). Da Nick, nomes como Grachi (2011) 11-11: En Mi Cuadra Nada Cuadra (2013) Kally ‘s Mashup (2017) e Eu Sou Franky (2015), entre outros. Algumas dessas séries atingiram níveis de sucesso comparáveis à febre RBD, e mais uma vez, o espanhol entrou na rotina de milhares de brasileiros e criou uma familiaridade afetiva que foi se construindo aos poucos, muitas vezes sem que a sequer percebessem. 

Imagem: reprodução/Latinidade – Violetta Live Tour, despedida da novela, em 2015

Streaming 

Com a chegada dos streamings, especialmente a Netflix, o espanhol ganhou um novo protagonismo no entretenimento global. Séries como La Casa de Papel (2017), Elite (2018), Vis a Vis (2015) e Quem Matou Sara? (2021) conquistaram o público brasileiro com narrativas de suspense envolventes, personagens complexos e uma estética pouco conhecida por nós anteriormente, que mistura o drama latino com o ritmo hollywoodiano. Esse sucesso marcou uma virada no consumo cultural por aqui, tornando o espanhol, antes visto como distante e estrangeiro, algo mais familiar

Imagem: reprodução/Rolling Stone Brasil

Boa parte dessa aceitação se deve à acessibilidade que o streaming oferece. A dublagem em português e as legendas derrubam barreiras linguísticas e aproximam o público de conteúdos que, antes, talvez passassem despercebidos. 

Ao meu ver, esse novo cenário ofereceu oportunidade para que muitos brasileiros passassem a buscar entender mais, e rejeitar menos, sua identidade latino-americana. A partir desse momento, o conteúdo em espanhol virou símbolo de cultura pop mundial. Foi nesse momento também que o interesse por aprender ou aperfeiçoar habilidades de conversação em espanhol começou a aumentar. 

Música 

Por fim, se tem algo que está no core da cultura latina, independente da língua, é a música. Shakira já fazia parte das playlists brasileiras nos anos 2000, muito antes de colaborações internacionais virarem algo mais comum na indústria. Hoje, nomes como Karol G, Bad Bunny, Maluma, Emilia e Rosalía são presenças constantes nos charts do Brasil, alguns lado a lado com artistas nacionais. Até Anitta, uma das brasileiras mais consagradas no cenário pop, mergulhou no mercado hispânico com faixas solo, como Mil Veces (2024), ou em colaborações como Downtown, com J Balvin, lançada em 2018, reconhecendo o quanto esse mercado se tornou estratégico e cada vez mais relevante no Brasil.

Imagem: reprodução/Billboard Brasil

A explosão do reggaeton nos últimos anos mostra que o espanhol passou, pouco a pouco, a se tornar uma linguagem comum no pop global. Aqui no Brasil, o ritmo se infiltrou nos nossos estilos musicais e tem moldado a forma como os clipes são gravados, fazendo com que consumamos reggaeton sem estar conscientes disso. Um exemplo mais recente que pode ser citado, é a colaboração entre Luisa Sonza e a cantora e compositora argentina Emilia Mernes, Bunda, lançada em fevereiro deste ano.

O interesse pelo nicho do espanhol está finalmente crescendo no mainstream entre o público mais jovem. Ainda é uma expressão tímida se comparado ao conjunto do que se consome musicalmente no país, mas a tendência é que cada vez mais artistas brasileiros façam parcerias com hispanofalantes, já que se observa uma demanda emergente por esse tipo de colaboração. 

A língua espanhola está profundamente enraizada no nosso cotidiano cultural. Seja pelas novelas que marcaram gerações, pelas séries que dominam as plataformas de streaming ou pelas músicas que marcaram nossa infância, o espanhol faz parte da nossa identidade também, e está na hora de começarmos a abraçar esse fato com orgulho. 

 

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Leia também: “Todos quieren ser latinos, pero les falta sazón” – Hollywood ama a cultura latina, mas não os latinos

Texto revisado por Angela Maziero Santana 

 

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