Dia Nacional da Visibilidade de Transexuais e Travestis

Comemorado desde 2004, o dia 29 de janeiro é um marco na vida de todos os transgêneros

 

Após muitos anos de luta por direitos igualitários, o Dia da Visibilidade Trans finalmente foi fixado no calendário oficial do brasileiro. A campanha que reuniu 27 transexuais no Congresso Nacional, em Brasília, fez com que o dia 29 de janeiro fosse registrado como um avanço nas políticas sociais do país.

Infelizmente, o Brasil é um dos países que mais mata pessoas trans e LGBTQI+, entrando no ranking dos países mais perigosos de se viver para essa comunidade. Em meio a notícias de barbáries e preconceitos, travestis e transexuais lutam, diariamente, para manter o respeito conquistado ao longo dos anos. Dentre as vitórias garantidas por eles, as principais são:

  • Uso do Nome Social: garantia de possibilidade de alteração do sexo e nome presentes no registro civil sem precisar de autorização judicial. Fazendo com que a pessoa não precise procurar a justiça para alterar seus dados. 
  • Cirurgia de redesignação sexual, feita pelo SUS: essa cirurgia é realizada para que as características genitais fiquem de acordo com o gênero que a pessoa se identifica. A cirurgia é realizada pelo SUS desde 2008. Em 2020, o Conselho Federal de Medicina divulgou uma resolução que reduziu a idade mínima para realização da cirurgia de 21 para 18 anos. 
  • Cotas: foram criadas para que estudantes trans tenham mais acesso a  universidades públicas e também, por decisão do Supremo Tribunal Federal, travestis e  mulheres transexuais tenham  30% de candidaturas femininas por partido.

Entretanto, elas não param por aí. Em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu – por 8 votos a 3 – que atos preconceituosos contra homossexuais e transexuais devem ser enquadrados como crime de racismo. É importante frisar que essa decisão foi provocada por conta de omissão legislativa e o Congresso Nacional ainda precisa aprovar uma lei própria.

Foto: Reprodução

Apesar de ser um processo lento, eles não perdem a esperança de, um dia, conviverem em uma sociedade com direitos iguais para todos, onde eles possam viver sem medo. O dia 29 de janeiro é um dia de respeito, de solidariedade e de luta. Para eles, para nós, para todos! 

E se você, leitor, acha que criança trans não existe, dá uma olhadinha nesse Reels incrível do Gustavo Blogueirinho. Uma chuva de fofura, conscientização e talento.

 

BANDEIRA

Foto: Reprodução

Um movimento tão importante não poderia surgir sem uma bandeira que os represente. As cores escolhidas – azul, rosa e branco – tem como objetivo demonstrar todas as manifestações possíveis da indentidade transexual.

O azul representa homens trans e transmasculinos; o rosa simboliza as mulheres trans e travestis; e o branco fala por aqueles que não se enquadram no binarismo de gênero, como os não-binários.

ENTREVISTA COM BRUNE MEDEIROS

Brune Medeiros, 22 anos, graduanda em Letras pela UFRJ, professora de idiomas e travesti. Em entrevista exclusiva, Brune conta ao Entretetizei como foi seu processo de aceitação, seus desafios e aconselha jovens que estão passando pelo processo de transição.

Foto: Reprodução/Arquivo pessoal

 

1) A nível emocional, quais foram as mudanças que mais percebeu entre o antes e depois? 

 Essa pergunta eu responderia em duas partes. Não podemos perceber a transição de uma pessoa trans só pelo uso de terapia hormonal. Minha transição começou em 2017, quando eu me assumi trans e fui me aceitando socialmente e psicologicamente como uma pessoa não binária. Fisicamente, pouca mudança tinha acontecido. Eu sempre fui de certa forma afeminada, mas nunca tive nenhuma disforia com o masculino. Isso mudou muito com os anos e hoje, por exemplo, apesar de eu não forçar uma rejeição ao masculino, só não me sinto mais atraída por aquilo que é rotulado como tal. Já depois do início da minha terapia hormonal, tudo mudou. Meu corpo começou a mudar e foi se tornando mais feminino. Eu fui me aceitando cada vez mais e gostando mais das minhas mudanças e do meu “novo corpo”. A leitura social feita a mim mudou muito e passei a sofrer muito mais preconceito do que jamais tinha sofrido. Mas por ser branca e de classe média, desfruto ainda de uma certa segurança que minhas irmãs pretas e periféricas não têem a mesma oportunidade. Hoje, apesar de todos os meus privilégios e dessa segurança, eu ainda tenho uma dificuldade enorme de conquistar novos espaços que tradicionalmente não são ocupados por pessoas trans, sobretudo a sala de aula. Nesse momento, eu percebo como a minha identificação como travesti vem acompanhada de muita luta e consciência enquanto trans e travesti. Eu nunca escolhi ser trans e mesmo assim tenho muito orgulho de quem sou, de quem estou buscando ser e daquilo que enfrento pra continuar sendo eu mesma.

 

2) E como foi seu processo de reconhecimento e a importância – e impacto – de compartilhar isso com outras pessoas, principalmente nas redes sociais?

Eu demorei a me assumir nas redes sociais. Por eu não ser assumida em casa, no início da minha transição, apenas amigos e quem convivia comigo na universidade tinham esse conhecimento. Na metade de 2017, eu criei meu nome social e entrei numa fase de adaptação dele por parte das pessoas. Isso demorou pra acontecer 100%, especialmente pela família, mas hoje só quem tem acesso ao meu nome morto basicamente são os bancos e registros da farmácia que eu não consegui mudar. De certo modo, eu já era feliz mesmo sem poder expor isso nas redes sociais, porque podia viver como eu mesma sem precisar colocar uma máscara por vinte e quatro horas, sete dias por semana. Já quando isso virou público, eu simplesmente deixei rolar. Quem quisesse aceitar continuaria comigo e quem não quisesse saiu da minha vida à força. A família obviamente demandou maior paciência, mas hoje já me respeitam e me aceitam como sou. E é sobre isso, sobre ter uma rede de apoio que tá ali não só pra te segurar quando você cai, mas que te enxergam enquanto você tá viva.

 

3) Quais foram as maiores dificuldades que você enfrenta ou enfrentou por ser uma mulher trans?

Eu sou travesti, né? Então, por mais que algumas travas tenham também essa identificação como mulheres trans, eu não pretendo ocupar esse espaço ou almejo esse reconhecimento. Eu sou travesti e me encaixo muito bem numa fluidez dentro disso que chamamos de transfeminilidade. Agora sobre dificuldades, e retomando meus privilégios, eu não diria que segurança tem sido impactante até então. Já recebi ameaças e fui muito assediada nas redes sociais, mas tudo dentro de um anonimato covarde. Uma das maiores dificuldades que estou enfrentando atualmente é no mercado de trabalho. Eu transicionei dentro de uma empresa, como estagiária, mas quando busco outras oportunidades, visto que meu tempo nela está acabando, eu levo muitas portas fechadas. Recentemente, deixei meu currículo em lojas no shopping para trabalhar como “extra natal”. Quando deixei meu currículo, ficou nítido que não me desejavam trabalhando ali e ouvi até que eu não tinha o perfil da marca e, por isso, nem adiantaria deixar o currículo. Além disso, minha terapia hormonal começou pouco antes da pandemia e os efeitos mais marcantes só apareceram há poucos meses, como meus seios. Assim, eu ainda acho que estou para vivenciar muito da materialidade de um corpo trans quando voltarmos para o “normal”.

 

4) Que conselho você daria para uma pessoa que está passando pelo processo de transição?

 Se rodeie de pessoas trans, cultive sua saúde psicológica e não se inspire em nenhuma pessoa cisgênera como modelo de transição. Você não é e nunca será tratada como tal. Se forçar cirurgias e procedimentos letais para buscar um padrão cisgênero é apenas uma tática de auto-ódio que a cisgeneridade nos impõe. Consuma conteúdos trans e se inspire em pessoas como você. Mude seus referenciais e beba da nossa própria fonte. Contribua para construir nossos próprios conhecimentos e conte sua própria história. Não se cale e sempre se defenda. Reconheça quando é hora de se preservar e quando você deve lutar pelos seus direitos. Lembre de como nossos corpos são alvos da cisgeneridade tóxica e não se sacrifique por nenhum cisgênero. Tenha paciência com a sua família mas não deixe de ser quem você é se eles não te aceitarem. Seja egoísta quando se trata da sua sobrevivência e se cuide pelos seus irmãos e irmãs trans. 

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Foto de destaque: Reprodução

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