Como ler John Green sem ler John Green: um guia para as inspirações do autor

Um dos maiores autores de young adult das última décadas, John Green, escreve livros que você já leu antes dele – ou que talvez leia depois

[Contém spoiler]

Em meados de março de 2021, John Green divulgou a capa do seu livro que seria lançado em 18 de maio de 2021 nos EUA, e deixou os fãs intrigados sobre esse ser um livro de não-ficção. Mas Green já tinha brincado com algo assim antes, em seu último romance young adult, quando deu o nome de Tartarugas Até Lá Embaixo para a obra, fazendo referência a uma história que Stephen Hawking conta no seu livro Uma Breve História do Tempo.

John Green já é inspirado há anos por obras assim, usando de outros autores para criar suas histórias. Em seus livros anteriores, Green brincou com cenários como Moby Dick (Herman Melville), Ulysses (James Joyce) e até O Pequeno Príncipe (Antoine de Saint-Exupéry).

Esse é um guia prático para te incentivar a ler as obras de John Green com outros olhos. Ou mesmo, ler os livros que o inspiraram tanto.

Tartarugas até lá embaixo (2017) – Ulysses, de James Joyce (1920)

Foto: Divulgação Intrínseca/Rodrigo Corral

Usando citações de O Apanhador no Campo de Centeio (J. D. Salinger), Não Sou Ninguém: poemas (Emily Dickinson) e até mesmo de Hamlet (William Shakespeare), John Green guia o leitor desse livro por uma versão moderna de Ulysses (James Joyce).

Aza Holmes é uma garota de 16 anos que só está tentando levar a sua vida o melhor que pode, mas quando o bilionário Russel Pickett desaparece e a polícia oferece uma recompensa de 100 mil dólares para quem o encontrar, sua melhor amiga, Daisy, cisma de bancar a detetive e ganhar o dinheiro.

Esse livro é inspirado na história de Ulysses, que por sua vez se inspira no conto grego sobre a guerra de Tróia.

No livro de James Joyce, o lado psíquico das personagens também é o foco principal. Leopold Bloom de Joyce é equivalente ao Davis de Green. Mas ao invés de procurar por um filho, como na obra de Joyce, Davis procura por seu pai.

A psicóloga de Aza até faz uma breve comparação de como o psicológico dela pode ser comparado com Molly Bloom, de James Joyce. Será que a drª Sing era o próprio Joyce aos olhos de John Green?

Quem é Você, Alasca? (2005) – O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry (1943)

Foto: Divulgação Intrínseca/Linda McCarthy

Você se lembra de ter lido um livro chamado O Pequeno Príncipe durante a sua infância? Se você não leu esse, mas leu Quem é Você, Alasca?, já está com algum tipo de compensação no currículo literário.

Green deu vida ao protagonista Miles Halter em compensação ao Pequeno Príncipe de Saint-Exupéry. Alasca é a rosa que se esconde no pequeno asteroide B-612.

Para encontrar uma resposta para seu Grande Talvez, Miles decide ir para um colégio interno, onde seu pai estudou, e lá ele conhece Alasca Young. A garota se mostra, aos poucos, como a possível grande resposta que Miles estava buscando.

Com a morte de Alasca, meses depois de se conhecerem, Miles finalmente a compara (e pode checar que isso está no livro sim!) com a rosa de O Pequeno Príncipe. Sem muito mais a fazer, ele entende que o que lhe resta, já que não é mais capaz de alcançar a sua rosa, é aceitar que ela representa o amor e ele sempre continuará procurando por ela – ou algo parecido – pelo resto da vida.

A Culpa É das Estrelas (2012) – O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald (1925)

Foto: Divulgação Intrínseca/Rodrigo Corral

Quem já leu O Grande Gatsby pode até achar que eu estou maluca, mas vamos relembrar a vida das personagens de Green nesse livro…

A Culpa É das Estrelas é um livro sobre como Augustus Waters conheceu e se apaixonou por Hazel Grace. E assim como Gatsby de Fitzgerald, Waters de Green queria ser lembrado, rico e famoso. Ele passa o livro todo tentando fazer atos grandiosos e heróicos, entregando tudo que tem para Hazel Grace, e no final é ele quem morre e a deixa para trás.

Em O Grande Gatsby temos menção sobre Daisy Buchanan esperar pela morte, e Green fez alusão a isso com Hazel tendo complicações em seu câncer.

A amiga avoada de Hazel, que só aparece no começo do livro, nos lembra Jordan Baker de Fitzgerald. Assim como Isaac – o amigo cego de Gus e Hazel -, ele não foi abandonado pela namorada Monica à toa. Isso também está presente no livro de Fitzgerald, mas no papel de George B. Wilson, que é completamente apaixonado por sua esposa, Myrtle, mas é traído e trocado.

A cena em que Gus leva Isaac para tacar ovos na casa de Monica não é uma inspiração aleatória também. Em O Grande Gatsby, quando Myrtle Wilson tenta fugir para se livrar de seu marido, o carro de Gatsby a atropela no meio da estrada. Seria uma compensação histórica-literária o Isaac acertando ovos no carro da Monica?

O Teorema Katherine (2006) – A Parte que Falta, de Shel Silverstein (1981)

Foto: Divulgação Intrínseca/Sarah Turbin

A maior parte do público que leu esse livro, odiou. E a grande desculpa é a constante matemática presente na história. Mas se você ignorar os gráficos como matemática pura, e os  olhar apenas como ilustrações dos pensamentos de Colin, vai entender onde eu quero chegar.

O Teorema Katherine fala sobre Colin, um prodígio mirim que viveu sua vida amorosa eternamente apaixonado por meninas chamadas Katherine. Foram 19, e todas elas terminaram com ele. Ao ler A Parte que Falta, entendemos a ideia de John Green.

Colin sai de casa para uma viagem de carro com seu melhor amigo, Hassan, só para ficar longe da “K-19”, mas tudo que ele consegue fazer é pensar nela durante sua estada de favor na casa de Hollis (que eles conhecem por acaso no começo do livro). Tudo que Colin quer, ao desenvolver o Teorema Fundamental da Previsibilidade das Katherines é tapar o seu pedaço que falta.

Shel Silverstein já tinha nos contado essa história antes, por meio do seu livro infantil, A Parte que Falta. Nessa obra, uma bolinha tem um pedaço faltando, e desesperada para encontrar essa parte que lhe falta, a bolinha sai rolando por aí, vivendo aventuras em lugares desconhecidos e entendendo, no fim de tudo, que ter um vãozinho em si não é o mesmo que ter algo faltando. E Colin também aprende isso em O Teorema Katherine.

Cidades de Papel (2008) – Moby Dick, de Herman Melville (1851)

Foto: Divulgação Intrínseca/Robyn Mackenzie

Na obra de Melville, temos a história do Capitão Ahab, que perdeu sua perna por causa da grande baleia Moby Dick, e desde então tenta capturar a baleia para ter sua vingança.

Quentin, o protagonista de Cidades de Papel, teve sua infância moldada pela imagem de sua apaixonante vizinha, Margo Roth Spiegelman. E “Q” ficou viciado nela desde um incidente, quando eram crianças, em um dia qualquer, em que eles encontraram um homem morto no parque perto de suas casas.

Em uma narrativa que aborda mistério, obsessão e ciclos emocionais de personagens curiosos, Green recria uma história muito parecida com Moby Dick, e assim como em todos os seus outros livros, ele deixa a pista disso em uma cena qualquer durante os acontecimentos.

A busca de Margo é como a busca por Moby Dick: quanto mais se chega perto, mais se entende que estava enganado sobre ela o tempo todo.

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*Crédito da foto de destaque: John Green/Tom Koene

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