Latinizei | Ana C.: poeta marginal, depressiva e crítica

Ana C. foi um nome de impacto na cultura nacional e marcou a poesia marginal em seu tempo

ALERTA DE GATILHO: DEPRESSÃO/SUICIDIO

Ana Cristina Cesar, ou Ana C., como assinava em suas obras, foi uma mulher incomparável em seu tempo. Com olhar aguçado e facilidade de se expressar por meio da escrita, ela cumpriu bem o papel de marginalizar a poetisa que vivia dentro da sua pele, e com muita energia mudou os rumos da poesia feminina brasileira para sempre.

Crítica literária e figurinha importante do movimento marginal, Ana C. é um respiro feminino (e feminista) em um país obscurecido pelo peso de um masculino que rouba as cenas da anarquia.

Carioca poeta

Foto: divulgação

Nascida em 1952, no Rio de Janeiro, Ana C. herdou de seu signo o dom da comunicação fácil por meio das artes, coisa que só geminianos conseguem fazer com clareza.

Ana C. foi filha de Waldo Aranha Lenz Cesar, um dos fundadores da editora Paz e Terra, que se destacou como uma das principais e mais importantes editoras no período da Ditadura Militar brasileira.

Ainda muito nova, Ana C. ditava para a mãe os poemas que gostaria de escrever mas ainda não sabia como, e aos 6 anos de idade recitou um poema autoral para uma professora da escola, e a consequência disso foi a publicação dele no Jornal da Tribuna. E com 9 anos criou um jornal completamente autoral, no qual publicava pequenas matérias e textos autorais.

Por volta dos 11 anos de idade, Ana C. já tinha um caderno em que reuniu suas memórias como poeta, porque sua obra, nessa idade, já se mostrava crescente em volume e qualidade, e movida por esse sentimento incontrolável, ela registrou seus feitos e recordou sentimentos sobre cada uma de suas poesias infantis.

Estrangeira

Foto: divulgação

No fim do seu estudo formal, Ana C. se mudou para a Inglaterra para fazer um intercâmbio, mas assim que voltou, pouco tempo depois, se inscreveu na PUC, e lá se formou com licenciatura em letras.

Foi nesse período que Ana C. conheceu a professora Clara Alvim, a mulher que mudaria sua vida para sempre. Foi essa mulher que conheceu a obra de Ana C. e se apaixonou e, por consequência, apresentou a aluna a uma amiga particular: a escritora Heloísa Buarque de Holanda.

No período do encontro, a Ditadura Militar estava comandando o país, e todas as artes estavam sendo perseguidas e censuradas, e então Ana C. entrou para o cânone dos poetas marginais: um grupo de autores poetas que ultrapassavam os limites impostos pelo governo e faziam suas artes, levando ao público posições políticas e sentimentais, tratando de melancolias, perdas e temas considerados um problema perante o governo. Justamente porque a poesia sempre foi uma arte mais esquecida, que os poetas marginais brilharam sob os holofotes de um país censurado.

Ana C. viajou pela América Latina e usufruiu da possibilidade de beber de outras culturas – que era algo que ela amava -, e com isso enriqueceu e lapidou ainda mais a sua obra poética.

Heloísa Buarque de Holanda

Foto: divulgação

No primeiro encontro, marcado com Heloísa Buarque de Holanda, foi realizado graças a Clara Alvim, que obrigou Ana C. a encontrá-la, foi lembrado eternamente pela timidez da poeta. Segundo Heloísa, Ana C. disse um bom dia educado, corou com o encontro e sumiu de vista. O próximo encontro só aconteceu com a publicação pronta.

Mas que publicação?! Bom, a professora de Ana C. era amiga de Heloísa, e assim, apresentou um texto da aluna para amiga, que se encantou instantaneamente pela obra e quis publicá-la em uma antologia poética junto de textos de mais 25 autores.

Foi Heloísa Buarque de Holanda que transformou Ana Cristina Cesar em um nome popular nos círculos de poesias dos anos 1960 e 1970. E como tal, é Heloísa quem mais recobra a memória afetiva do Brasil sobre a amiga.

O termo feminista na vida de Ana C. também vem da boca de Heloísa Buarque de Holanda. Apesar de ser rejeitada no círculo feminista por pessoas que não a compreendem tão bem, a amiga já afirmou que Ana C. se recusou a ceder ao essencialismo de gêneros que marcavam o movimento feminista nas décadas de 60 e 70, e seguiu uma vida revoltada contra o tipo de feminismo popular em seu tempo.

Depressão e ansiedade

Foto: divulgação

Assolada por crises de ansiedade de uma mente inquieta, Ana C. é lembrada pelos amigos como uma pessoa intelectual, extremamente apaixonada por escrever e igualmente incapaz de o fazer. Ela se atirou da janela do apartamento dos pais, no próprio Rio de Janeiro em que tinha nascido.

Heloísa Buarque de Holanda já afirmou que entende o peso de estar sempre criando literatura que a amiga carregava, já que era alguém que estava sempre no meio de um processo criativo e criador. E com tantas coisas acontecendo dentro de sua própria cabeça, Ana C., inevitavelmente, sofria com crises ansiosas e depressivas, mergulhando em momentos melancólicos e insatisfeitos com a vida.

Ana C. decidiu que a vida andava melancólica demais, soturna e se viu diante da desesperança, e motivada por toda essa agonia que lhe afligia o peito, tirou sua própria vida com apenas 31 anos de idade, em outubro de 1983.

Seus sentimentos depressivos são facilmente encontrados em sua obra, em cartas e revividas em entrevistas dadas pelos amigos mais próximos, que ressaltam que Ana C. era uma tempestade vívida, mas carregava uma forte melancolia em sua alma.

Publicações e legado

Foto: divulgação

Em vida, Ana C. publicou o livro A Teus Pés, mas em morte acumulou infinidades de obras que possivelmente nem sonhou um dia compartilhar.

Depois de falecer, Ana C. continuou existindo entre os amigos e os fãs, e deixou cartas e diários, todos manuscritos, que foram organizados por quem revive sua memória com constância.

No ano de 2016, Ana C. foi homenageada na 14ª Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP), e teve destaque para suas obras que, infelizmente, parecem seguir atingindo um público reduzido demais para o tamanho da sua grandiosidade.

Antes de tudo isso, aos 14 anos, Ana C. já tinha dado as caras como escritora, editora e ilustradora de um livro autoral que seria o presente para o pai, mas usando um pseudônimo, o que já dava indícios de que depois seguiria com um tipo de pseudônimo literário para o resto de sua vida como escritora. Esse livro segue intacto, e pode ser encontrado nos arquivos de Ana C., que resistem para o público em exposições honrosas.

Agora que você já sabe um pouco mais sobre essa mulher inigualável para a cultura nacional, te esperamos nas nossas redes sociais – Twitter, Insta e Face -, para conversar um pouco mais sobre Ana C. e poesia marginal.

*Crédito da foto de destaque: divulgação

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