Latinizei | Hilda Hilst: poeta por opção, fascinada pelo ocultismo e dona do Sol brasileiro

Hilda Hilst foi responsável por criar um verdadeiro centro cultural em sua casa, além de levar poesia para todos os cantos do Brasil

ALERTA DE GATILHO: ESQUIZOFRENIA/ASSÉDIO 

Hilda Hilst é uma porta de entrada para a literatura nacional e feminina, poeta por escolha e curiosa por questões ocultistas, ela criou um verdadeiro Sol para a arte brasileira.

Viveu plenamente, aproveitou tudo que a vida lhe ofereceu, escreveu obras maravilhosas e alimentou a cultura nacional com tudo que podia dar, ou seja: ela mesma e todas as suas complexidades.

As complexidades de berço

Foto: divulgação

Nascida em 21 de abril de 1930, no interior de São Paulo, Hilda era filha única da relação matrimonial de seus pais, mas tinha um irmão por parte materna, de um primeiro casamento.

Filha de fazendeiros, Hilda teve noção de arte com o pai durante a infância, que era um apaixonado por arte e chegou a escrever cartas para o Correio Paulistano, nas quais ele falava sobre sua frustração em relação ao movimento modernista.

Apesar de ter tido o exemplo do pai como um grande admirador das artes, Hilda Hilst não tinha proximidade direta com ele, porque seu pai esperava um filho e não uma menina da gravidez da esposa. Foi seu pai o responsável por declarar a frase “Que azar!”, quando soube que o bebê era do sexo feminino.

Quando falamos que ele foi um exemplo para Hilda, é porque foi ele quem sempre marcou a escrita tão direta da filha, presente das mais diversas formas em sua obra crítica.

“Escrever, então, é para mim sentir meu pai dentro de mim, em meu coração, me ensinando a pensar com o coração, como ele fazia. […]” – Hilda Hilst

Espírito anarquista

Foto: divulgação

Hilda Hilst estudou em um internato paulista chamado Santa Marcelina, e por lá foi marcada por atos determinados como delinquentes pelas freiras que comandavam o local.

Talvez sua anedota mais popular seja sobre o dia em que Hilda Hilst roubou o vinho que seria usado na missa de domingo e se embebedou, o que causou uma comoção geral entre a comunidade religiosa, especialmente por ser tão jovem.

Mas talvez Hilda estivesse se preparando para o peso de reencontrar o pai, aos 16 anos. Diagnosticado com esquizofrenia, o pai de Hilda Hilst a confundiu com sua mãe e propôs a ela que passasse com ele o fim de semana de forma romântica.

Não sabemos ao certo o que houve entre eles além do constrangimento da situação que aconteceu em ambiente público, mas fica a suspeita de que Hilda tenha se sentido assediada pelo pai – e seguimos com a esperança de que nada mais grave tenha acontecido entre eles.

Depois disso, Hilda Hilst estudou advocacia (tal como Clarice Lispector), mas foi no ambiente estudantil que Hilda teve a oportunidade de conhecer a também escritora Lygia Fagundes Telles, que foi homenageada na faculdade onde Hilda estudava. O encontro marcou o início da compreensão de Hilda Hilst como poeta, pois ela se apresentou para Lygia como tal, chegando até a entregar alguns de seus manuscritos para a autora renomada.

Vale lembrar que Lygia Fagundes Telles foi uma grande amiga de Hilda Hilst, e tudo graças a esse encontro entre as duas.

Vinícius de Moraes e as questões femininas

Foto: divulgação

Depois de publicar três livros muito bem elogiados pela crítica e subir os patamares de reconhecimento como a artista que era, Hilda Hilst conheceu o poeta Vinicius de Moraes.

Existem textos conflitantes sobre a dupla, já que há quem alegue que Hilda e Vinicius tiveram uma relação de amantes durante um curto período de tempo, mas há quem diga que ambos jamais se envolveram. A biografia de Hilda Hilst confirma a curta relação e exibe o par como apaixonados em um primeiro momento, para se tornarem trovões raivosos e ressentidos um do outro em seguida.

Para curar a alma ferida, Hilda Hilst partiu do Brasil rumo à Europa, e por lá tentou se aproximar do ator Marlon Brando. Em uma aventura na madrugada, Hilda se passou por uma jornalista a fim de entrevistar o ator, mas foi descartada sem hesitação.

De volta ao Brasil, em 1959, Hilda Hilst publicou o livro Roteiro do Silêncio, onde aborda suas confidências mais pessoais em poemas e sonetos, descartando os amores frustrados que tinha vivido até então. E por esse livro, Hilda Hilst se tornou um alvo para os críticos, que deram mais importância à sua aparência do que ao seu talento, e esqueceram que Hilda Hilst já era um nome na sociedade literária.

Anos mais tarde, Hilda apadrinhou de volta seu anarquismo juvenil e escreveu o livro Sete Cantos do Poeta, Para o Anjo, inspirada por seu romance com um homem oito anos mais novo que ela.

Casa do Sol

Foto: divulgação

Ao encontrar um parceiro ideal, Dante Casarini, Hilda se mudou com ele para Campinas, no interior de São Paulo, onde constrói uma casa.

Nesse momento de sua vida, ela se conectou com a natureza que abraçava a nova casa e então começou a se ver mais ligada ao misticismo, o que foi um grande impacto na sua obra a partir de então.

A Casa do Sol, como era conhecida, foi a casa em que Hilda morou pelo resto de sua vida, e onde viveu cercada de amigos e personalidades famosas, sempre com muitas festas e encontros.

No período inicial na nova casa, ela se dedicou a escrever peças de teatro, todas encenadas por alunos universitários e, justamente por isso, em 1969, Hilda Hilst recebeu o prêmio Anchieta.

Foi por volta do fim dos anos 1960 que Hilda se separou de Dante, mas continuou vivendo com ele sob o mesmo teto até o fim de sua vida. A Casa do Sol ainda abrigou uma nova parceira de Dante Casarini, e eles viveram em harmonia completa, já que a paixão tinha se tornado companheirismo amistoso.

Na Casa do Sol, Hilda também alegou ter visto um disco voador e declarou que vivia situações sobrenaturais na sua rotina, e tudo isso a deixava extremamente curiosa e interessada pelo oculto. Inspirada por uma leitura que falava sobre conversas com pessoas mortas por meio de rádio, Hilda Hilst se arriscou a tentar alguma coisa nesse sentido, buscando conversar com o pai e a mãe, ambos já falecidos.

Em vida

Foto: divulgação

Hilda Hilst publicou mais de 28 livros durante sua vida, mas não era lida como outros grandes nomes do mercado editorial. Pelo contrário, Hilda foi abandonada pelas grandes editoras e o grande público, marginalizada por seu temperamento intempestivo e sua força considerada bruta em demasia.

Ela foi uma das principais críticas do mercado editorial brasileiro, que dava um espaço enorme para nomes estrangeiros e desprezava a cultura nacional. Hilda Hilst também foi uma grande inimiga do sucesso de Paulo Coelho, porque alegava que o autor era fantasioso em sua obra e que sua capacidade em se tornar um best seller ofendia as outras publicações nacionais que não fossem escritas por ele.

Seu maior sonho era ser comprada por uma grande editora e conseguir alcançar o mercado literário de modo mais relevante, mas apenas em 2018 Hilda Hilst se tornou um nome nos grandes catálogos literários. Como muitos outros nomes da cultura mundial, Hilda Hilst só ganhou reconhecimento depois de sua morte.

Cansada da falta de amor do seu povo por sua obra, Hilda mergulhou de cabeça em obras mais pornográficas, e assim satiriza que sua obra seria finalmente lida, pois estava descendo muitos níveis de qualidade.

Agora e para sempre, Hilda Hilst

Foto: divulgação

Diagnosticada com câncer de pulmão, Hilda Hilst se submeteu a uma cirurgia de remoção do tumor, o que comprometeu sua saúde de forma irreversível.

Em fevereiro de 2004, Hilda Hilst faleceu por complicações de saúde, e deixou para trás uma obra crítica e de grande importância para a literatura feminina e brasileira.

A Casa do Sol resistiu ao tempo e hoje serve de um tipo de museu que homenageia Hilda Hilst. Fora isso, Hilda foi homenageada – finalmente – pela FLIP, em 2018.

Sua obra e sua vida também foram lembradas na biografia Eu e Não Outra, organizada por Laura Folgueira e Luisa Destri, que reúne muito mais sobre a existência da poeta.

Essa foi Hilda Hilst, uma mulher que enfrentou o descaso editorial, foi desprezada pelo pai e driblou as normas de moral social para ser lida e conhecida como autora. E agora que você já aprendeu um pouco mais sobre ela, te esperamos lá nas redes sociais – Twitter, Insta e Face – para conversar sobre quais os livros dela que você mais gosta, ou que mais quer ler.

*Crédito da foto de destaque: divulgação

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