Latinizei | Elza Soares: a dama imortal da música brasileira

Elza Soares foi um marco na música brasileira, na cultura do nosso país e no papel de ativista feminina e negra

ALERTA DE GATILHO: VIOLÊNCIA SEXUAL

Dia 20 de janeiro de 2022, logo no começo de um ano que promete muitas conquistas para a cultura e para a sociedade brasileira, Elza Soares deixou o mundo, e hoje nós a homenageamos.

O Latinizei tem sempre a honra de falar sobre mulheres fortes, com vidas extraordinárias, e hoje também faz o papel de homenagem a essa perda incalculável.

Elza Soares foi uma grande mulher, e já saudosas de sua voz, nós, as manas aqui do Entretê, deixamos nossa singela homenagem para essa mulher tão inspiradora.

Soares

Foto: divulgação

Nascida em 23 de junho de 1930, no estado do Rio de Janeiro, Elza Gomes da Conceição foi criada no bairro Água Santa, na capital.

Filha de família muito humilde, Elza era moradora de cortiço, usava sua voz como distração quando tinha que fazer alguma tarefa para ajudar a família, e tinha a música como um laço com o pai, que tocava violão e cantava com a filha nas horas vagas.

Aos 13 anos de idade, Elza Gomes da Conceição se tornou Elza Soares, já que o nome do primeiro marido foi dado a ela de herança ao se casar precocemente. O homem, Lourdes Antônio Soares, era muitos anos mais velho que ela, e o casamento aconteceu por ordem de seus pais.

Vítima de violências sexuais nessa fase de sua vida, Elza Soares teve seu primeiro bebê aos 14 anos, e aos 15 anos já era mãe de duas crianças. Aos 21 anos de idade, Elza se tornou viúva do primeiro marido, e se viu obrigada a cuidar de si mesma e de seus filhos.

Elza ainda teve que lidar com a perda de dois de seus filhos, falecidos por consequências da desnutrição. Fora isso, por volta de 1950, sua filha foi sequestrada, pouco antes da morte do pai, e a consequência disso foi Elza Soares rever a filha apenas 30 anos depois.

Nascimento de uma voz

Foto: divulgação

Incontestavelmente extraordinária, a voz de Elza Soares surgiu no cenário musical brasileiro pelo programa de Ary Barroso, quando ela, desesperada por conseguir uma forma de alimentar seus filhos e incapaz de ter ajuda dos pais, se inscreveu no programa de calouros.

Já na sua chegada ao programa, Elza Soares foi notada por todos ao seu redor, antes mesmo de abrir a boca para cantar sua música. Indo até lá pelo desespero, focada e esperançosa em ganhar o prêmio em dinheiro que os vencedores ganhavam, ela subiu no palco com roupas presas com alfinetes, pesando algo próximo de 30 quilos, e completamente escondida da família.

Ali, sem que se percebesse, nascia a dama da música brasileira.

Ao ser questionada sobre de que planeta vinha, ela foi certeira ao responder: “Do planeta fome”. Nascia então, não só a vencedora daquele dia do programa, como uma das vozes mais icônicas do Brasil.

Mané Garrincha, a Ditadura Militar e toda a dor

Foto: divulgação

Participando novamente de um concurso musical, lá pela década de 1960, Elza Soares conseguiu um contrato sólido para se apresentar semanalmente, o que trouxe a ela a possibilidade de se apresentar em casas de show, e foi então que viver de música passou a ser uma realidade para a artista.

Nessa mesma época, Elza conheceu o jogador de futebol Mané Garrincha, que era um grande nome no esporte e ainda estava casado, e então chegou a ela a fama de mulher da vida, uma destruidora de lares. Mas muito pouco intimidada com isso, ela seguiu em frente, se casou com um homem que amava e se manteve ao lado dele por quase 17 anos.

Alcoólatra e violento, Garrincha agredia a esposa, causava repercussão na mídia pelo seu temperamento tempestuoso e feria ainda mais uma mulher já marcada pela desolação. Isso fora o acidente de carro que Garrincha, bêbado, causou, que fez com que a mãe de Elza falecesse ao ser arremessada do carro. Tomando coragem para se divorciar, Elza Soares terminou sua relação com Garrincha em 1982, e em 1983 ele faleceu, somando mais uma dor à mulher que um dia o tinha amado.

O filho do casal, conhecido como Garrinchinha, sofreu um acidente de carro pouco depois da morte do pai, e também faleceu.

No entanto, antes do divórcio com o segundo marido, o casal foi obrigado a sair do Brasil durante os anos de Ditadura Militar, e fugiram para a Itália depois da casa do casal ter sido metralhada durante a perseguição do governo à classe artística.

Maria da Vila Matilde e suas lutas

Foto: divulgação

Na década de 1960, Elza Soares ficou conhecida por realizar, em sua casa, um chá com membros da comunidade LGBTQIA+. Durante toda a sua vida, foi uma voz que batalhou pelo respeito e igualdade de membros da comunidade, inclusive, mais recentemente, demonstrou seu apoio público via Twitter à nova participante do BBB, Linn da Quebrada.

Elza Soares também se consagrou como a voz da luta feminista e da luta preta, em especial com sua música Maria de Vila Matilde.

Incansável, Elza Soares questionava posições de governo, descaso com as favelas e áreas periféricas, o preconceito contra diferentes sexualidades e a violência contra as mulheres, além das suas críticas ao tratamento dado ao povo preto.

No íntimo, a artista batalhava com a dor da perda dos quatro filhos, dois pela fome, um em um acidente de carro e o último, já com 59 anos de idade, por complicações de uma infecção. Elza afirmou que fora a perda dos filhos, que era sempre uma cicatriz aberta, o resto ela tirava de letra.

Prêmios e reconhecimento cultural

Foto: divulgação

Eleita pela BBC de Londres como a cantora brasileira do milênio, em 1999, Elza Soares não terminou seu reconhecimento artístico por aí.

Em 2003, foi indicada ao Grammy Latino, apresentou o hino nacional na abertura dos Jogos Panamericanos no Rio de Janeiro e recebeu diversos prêmios pelo álbum A Mulher do Fim do Mundo, que reuniu apenas inéditas da carreira dela, incluindo o Grammy Latino de Melhor Álbum de MPB.

Elza Soares chegou a ter sua história contada pela Mocidade Independente de Padre Miguel, no ano de 2020.

Ainda em vida, Elza Soares viu sua biografia ser contada por meio de um espetáculo teatral, sua biografia escrita ser lançada – pelo nome de Zeca Camargo – e diversas homenagens na música e na cultura, assim como projetos sociais.

Feita a nossa homenagem a essa mulher incomparável, te esperamos lá nas redes sociais – Twitter, Insta e Face -, para conversar um pouco mais sobre Elza Soares e seu legado.

*Crédito da foto de destaque: divulgação

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